A teoria da actio nata [viés objetivo] ensina que o prazo prescricional nasce da VIOLAÇÃO do direito.

A teoria da actio nata com o viés subjetivo orienta que o prazo prescricional se inicia com o CONHECIMENTO da violação do direito.

Vamos agora especificar um pouco mais.

Teoria da actio nata [viés objetivo]

Segundo a teoria da actio nata, os prazos prescricionais se iniciariam no exato momento do surgimento da pretensão. A teoria foi desenvolvida por Savigny.

Em outras palavras, somente a partir do instante em que o titular do direito pode exigir a sua satisfação é que se revela lógico imputar-lhe eventual inércia em ver satisfeito o seu interesse.

O ordenamento jurídico brasileiro adota a teoria, ao dispor, no art. 189, que “violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição”.

Teoria da actio nata com o viés subjetivo

Todavia, no âmbito da jurisprudência, o STJ passou a admitir que, em determinadas hipóteses, o início dos prazos prescricionais deveria ocorrer a partir da ciência do nascimento da pretensão por seu titular, no que ficou conhecido como o viés subjetivo da teoria da actio nata.

Com efeito, pelo sistema subjetivo, o início do prazo prescricional “só se dá quando o credor tenha conhecimento dos elementos essenciais relativos ao seu direito”.

O caráter de excepcionalidade do viés subjetivo

O STJ já consignou que “a aplicação da teoria da actio nata em sua vertente subjetiva é excepcional” (REsp 1.736.091/PE, Terceira Turma, julgado em 14/05/2019, DJe 16/05/2019).

Nesse sentido, foi editada a Súmula 278/STJ, segundo a qual o termo inicial do prazo prescricional, na ação de indenização, é a data em que o segurado teve ciência inequívoca da incapacidade laboral.

Os valores prestigiados pelo viés objetivo e subjetivo

A teoria da actio nata, em seu viés objetivo, prestigia o valor SEGURANÇA (jurídica).

A teoria da actio nata, em seu viés subjetivo, prestigia o valor justiça.

Ambos valores são extremamente importantes para o direito e é por isso que é importante saber quais as hipóteses a regra excepcional (subjetiva) merece ser aplicada.

Casos em que se admite a aplicação do caráter subjetivo

1. Prazos prescricionais curtos, na medida em que o estabelecimento do termo inicial do prazo prescricional na data do nascimento da pretensão (= sistema objetivo) possui o inconveniente de impor ao credor o pesado ônus de identificar, em curto espaço de tempo, quem é o devedor e a extensão de sua pretensão, o que nem sempre se revela fácil ou possível.

2. Notória dificuldade para o titular do direito tomar conhecimento do nascimento da sua pretensão, como ocorre nas hipóteses em que há alguma distância física entre o titular do direito e o objeto tutelado pelo sistema jurídico (p. ex. propriedades rurais longínquas) ou naquelas outras em que existe algum lapso temporal entre o ato ilícito (dano-evento) e a lesão (dano-prejuízo), como ocorre, por exemplo, nos casos de problemas de saúde cujos sintomas demoram a surgir, ex: o vírus HIV.

Nesses casos, a doutrina leciona que “se assim não ocorresse, seria punido quem não ficou ‘inerte’, pois nem sempre a não-ação tem como causa a inércia. Esta é a ausência de atividade quando esta (atividade) teria sido possível e, portanto, exigível”.

Nesse sentido, a Terceira Turma do STJ já teve a oportunidade de ressaltar que, em determinadas hipóteses deve-se, de fato, adotar o viés subjetivo da teoria da actio nata, “sob pena de reputar iniciado o prazo prescricional quando o lesado nem sequer detinha a possibilidade de exercer sua pretensão, em claro descompasso com a finalidade do instituto da prescrição e com a boa-fé objetiva, princípio vetor do Código Civil” (AgInt no AREsp 876.731/DF, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 15/09/2016, DJe 30/09/2016).

3. A constatação, na hipótese concreta, de que o credor tinha ou deveria ter ciência do nascimento da pretensão, o que deve ser apurado a partir da boa-fé objetiva e de standards de atuação do homem médio;

4. O fato de se estar diante de responsabilidade civil por ato ilícito absoluto;

As relações jurídicas de direito relativo são aquelas que possuem sujeito passivo determinado ou determinável, de tal modo que as posições jurídicas do sujeito ativo são direcionadas, exclusivamente, ao sujeito passivo. São exemplos dessa espécie de relação as relações jurídicas obrigacionais (inadimplemento, mora, adimplemento ruim, etc.).

Por outro lado, as relações jurídicas de direito absoluto são aquelas que possuem sujeito passivo indeterminado – o chamado sujeito passivo total ou universal. São exemplos as relações jurídicas de direito real (p. ex. a relação jurídica de propriedade) e a relação jurídica de direitos da personalidade. Neste caso, as posições jurídicas titularizadas pelo sujeito ativo são oponíveis erga omnes, isto é, não contra um sujeito determinado, mas sim contra o sujeito passivo total ou universal, a quem é imposto um dever geral de abstenção.

A violação de posição jurídica ativa conteúdo de relação jurídica de direito absoluto dá ensejo à responsabilidade por ato ilícito absoluto, que representa, a rigor, desrespeito ao mencionado dever geral de abstenção e que, via de regra, recebe o epíteto de responsabilidade civil extracontratual.

Diante destas considerações, importa consignar que o viés subjetivo da teoria da actio nata encontra maior campo de aplicação na hipótese de responsabilidade civil por ato ilícito absoluto (= responsabilidade civil extracontratual), pois da própria natureza jurídica desta espécie de responsabilidade e, sobretudo, da presença do sujeito passivo universal, decorre uma maior dificuldade para o credor determinar o causador e a extensão do dano sofrido.

Tratando-se de sujeito passivo total ou universal e, portanto, de violação de um dever geral de abstenção a todos imposto, é lógico e razoável concluir que o credor terá maior dificuldade para tomar conhecimento da lesão, da sua extensão e do agente que praticou o ato ilícito.

Em âmbito jurisprudencial, a Terceira Turma do STJ, no julgamento do REsp 1.711.581/PR, ressaltou que, muito embora se admita a aplicação do viés subjetivo da teoria da actio nata em determinadas situações, esta “tem sido aplicada por esta Corte em casos de ilícitos extracontratuais nos quais a vítima não tem como conhecer a lesão a sua esfera jurídica no momento em que ocorrida”, prestigiando o acesso à justiça.

No mesmo sentido, também a Quarta Turma, no julgamento do REsp 1.354.348/RS, fixou o entendimento de que “na responsabilidade contratual, em regra, o termo inicial da contagem dos prazos de prescrição encontra-se na lesão ao direito, da qual decorre o nascimento da pretensão, que traz em seu bojo a possibilidade de exigência do direito subjetivo violado, nos termos do disposto no art. 189 do Código Civil, consagrando a tese da actio nata no ordenamento jurídico pátrio. Contudo, na responsabilidade extracontratual, a aludida regra assume viés mais humanizado e voltado aos interesses sociais, admitindo-se como marco inicial não mais o momento da ocorrência da violação do direito, mas a data do conhecimento do ato ou fato do qual decorre o direito de agir, sob pena de se punir a vítima por uma negligência que não houve, olvidando-se o fato de que a aparente inércia pode ter decorrido da absoluta falta de conhecimento do dano” (REsp 1.354.348/RS, Quarta Turma, julgado em 26/08/2014, DJe 16/09/2014).

Assim, pode-se afirmar que, em regra, o viés subjetivo da teoria da actio nata possui maior afinidade com as hipóteses de responsabilidade civil por ato ilícito absoluto, estabelecendo-se como termo a quo do prazo prescricional a data do conhecimento, pelo titular, do nascimento da pretensão.

5. A expressa previsão legal a impor a aplicação do sistema subjetivo.

É o que se verifica, por exemplo, no art. 27 do Código de Defesa do Consumidor – ao estatuir que o prazo prescricional se inicia a partir do conhecimento do dano e de sua autoria pelo consumidor – e no art. 206, § 1º, II, “b”, do Código Civil, ao estabelecer que, nos contratos de seguro em geral, o termo a quo do prazo prescricional é a “ciência do fato gerador da pretensão”.

Outro exemplo na legislação é a lei 8.112/90, que trata do regime jurídico dos servidores públicos federais, que determina que: Art. 142.  A ação disciplinar prescreverá: (…) § 1º O prazo de prescrição começa a correr da data em que o fato se tornou conhecido.

REFERÊNCIAS

Este miniartigo retirou todas as conclusões do REsp 1.836.016-PR, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Rel. Acd. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por maioria, julgado em 10/05/2022.