Primeiro um conceito importante, NÃO-CUMULATIVIDADE (ou princípio da não-cumulatividade).
Consiste em deduzir do valor do tributo devido pelo contribuinte o valor do tributo incidente sobre a operação anterior. Objetiva-se com isso reduzir o impacto da tributação sobre o consumo de bens e serviços, diminuindo o custo tributário para o consumidor final.
Foi adotada originariamente na Constituição de 1988 em relação SOMENTE ao ICMS, o IPI, os impostos de competência residual e as contribuições sobre novas fontes de custeio da seguridade social (arts. 153, § 3º, II, 155, § 2º, I, 154, I, e 195, § 4º).
A emenda constitucional n. 42/2003 fez com que o princípio pudesse ser aplicado para determinados setores da economia em relação às contribuições para a seguridade social incidentes sobre a receita ou o faturamento (art. 195, § 12). Com fundamento nessa disposição constitucional, as Leis n. 10.637/2002 e 10.833/2003 instituíram a não cumulatividade para o PIS e a Cofins, respectivamente.
CF. Art. 195. § 12. A lei definirá os setores de atividade econômica para os quais as contribuições incidentes na forma dos incisos I, b; e IV do caput, serão não-cumulativas.
Assim, por exemplo, o ICMS relativo a um BOLO DE MILHO deverá ter abatido o ICMS relativo à farinha de trigo, por exemplo. Supondo que o ICMS de um bolo seja 100 reais, o boleiro gastou farinha de trigo no bolo, pela qual pagou 20 reais de ICMS. O ICMS deverá ser 100 – 20= 80 reais.
As diferenças entre a não-cumulatividade do ICMS/IPI para a do PIS/COFINS são as seguintes:
1. Previsão no ordenamento:
▪ A do ICMS/IPI estão diretamente previstas na CF/88.
▪ A da PIS/COFIN, a CF/88 abre a possibilidade de lei prever, o que de fato foi feito pelas Leis n. 10.637/2002 e 10.833/2003.
2. Limites:
▪ Em relação ao IPI, a CF/88 não estabeleceu limites. Quanto ao ICMS, a não-cumulatividade não estabelece limites sobre quais operações haverá não cumulatividade, apenas determinando que “a isenção ou não-incidência, salvo determinação em contrário da legislação: a) não implicará crédito para compensação com o montante devido nas operações ou prestações seguintes; b) acarretará a anulação do crédito relativo às operações anteriores”, art. 155, § 2º, II, CF. Em ambos os casos, é ressalvado ao legislador ordinário dispor de forma contrária.
▪ Em relação ao PIS/COFINS, como a CF apenas previu que leis tratariam do tema, a normatização limitou e apontou em que operações específicas incidiria a não-cumulação. As Leis n.º 10.637/2002 e 10.833/2003 limitaram a aplicação do princípio da não-cumulatividade, estabelecendo quais os créditos que a pessoa jurídica poderá abater do valor das contribuições devidas, relativos “a bens adquiridos para revenda, com as exceções nelas previstas; bens e serviços utilizados como insumos na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados a venda, inclusive combustíveis e lubrificantes; alugueis de prédios, máquinas e equipamentos, pagos a pessoa jurídica, utilizados nas atividades da empresa; máquinas, equipamentos e outros bens incorporados ao ativo imobilizado, adquiridos ou fabricados para locação a terceiros ou para utilização na produção de bens destinados à venda ou na prestação de serviços; valores pagos e relativos a edificações e benfeitorias em imóveis de terceiros, pagos pelo locatário etc.”
3. Técnica adotada
▪ No que concerne ao IPI e ao ICMS, a regra da não-cumulatividade tem por objetivo evitar a chamada tributação em cascata, vale dizer, a incidência de imposto sobre imposto, no caso de tributos multifásicos, assim entendidos aqueles exigíveis em operações sucessivas. Estabelece-se, assim, um sistema de créditos que poderá ser usado como forma de pagamento do tributo. O contribuinte deve subtrair da quantia devida a título desses impostos o(s) crédito(s) acumulado(s) na(s) operação(ões) anterior(es).
▪ De outra parte, para tributos de diversa configuração, como as contribuições em tela, conquanto também seja a elas aplicável o princípio da capacidade contributiva, por ostentarem materialidade de imposto, a não-cumulatividade há de revestir sistema distinto. Cuidando-se de contribuições cuja base de cálculo é a receita bruta ou faturamento, e que, portanto, não têm conexão direta com determinado produto ou mercadoria, a técnica de não-cumulatividade a ser observada é de “base sobre base“.
Ricardo Lodi Ribeiro bem remarca essa distinção: Assim, se em relação às mercadorias e produtos, a não-cumulatividade significa que o imposto a ser pago na operação de saída é a diferença entre o mesmo imposto incidente nesta e os que foram pagos nas operações anteriores, o mesmo não acontece quando o instituto é transmutado para os tributos incidentes sobre a receita bruta ou faturamento. Nestes, não-cumulatividade significa que o tributo a pagar é encontrado pela aplicação da alíquota sobre a diferença entre as receitas auferidas e as receitas necessariamente consumidas pela fonte produtora (despesas necessárias). (A não-cumulatividade das contribuições incidentes sobre o faturamento na Constituição e nas leis, in Revista Dialética de Direito Tributário n. 111, p. 102).
Dito isso, para se determinar quando incidirá a técnica da NÃO-CUMULATIVADE em relação a PIS/CONFINS é de suma importância saber O QUE É INSUMO. Tão importante que o STJ teve que estabelecer em RECURSOS REPETITIVOS, que sugiro a leitura porque o acórdão está digno de atenção.
No acórdão apresentou-se três correntes para o que seja insumo e adotou-se os critérios da ESSENCIALIDADE e da PERTINÊNCIA.
Dito a adotada, só por conhecimento, eis as três correntes/orientações:
“É importante registrar que, no plano dogmático, três linhas de entendimento são identificáveis nos votos já manifestados, quais sejam:
i) orientação restrita, manifestada pelo Ministro Og Fernandes e defendida pela Fazenda Nacional, adotando como parâmetro a tributação baseada nos créditos físicos do IPI, isto é, a aquisição de bens que entrem em contato físico com o produto, reputando legais, via de consequência, as Instruções Normativas da SRF ns. 247/2002 e 404/2004; ii) orientação intermediária, acolhida pelos Ministros Mauro Campbell Marques e Benedito Gonçalves, consistente em examinar, casuisticamente, se há emprego direto ou indireto no processo produtivo (“teste de subtração”), prestigiando a avaliação dos critérios da essencialidade e da pertinência. Tem por corolário o reconhecimento da ilegalidade das mencionadas instruções normativas, porquanto extrapolaram as disposições das Leis ns. 10.637/2002 e 10.833/2003; e iii) orientação ampliada, protagonizada pelo Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Relator, cujas bases assenhoreiam-se do conceito de insumo da legislação do IRPJ. Igualmente, tem por consectário o reconhecimento da ilegalidade das instruções normativas, mostrando-se, por esses aspectos, a mais favorável ao contribuinte.”
Demarcadas tais premissas, tem-se que o critério da essencialidade diz com o item do qual dependa, intrínseca e fundamentalmente, o produto ou o serviço, constituindo elemento estrutural e inseparável do processo produtivo ou da execução do serviço, ou, quando menos, a sua falta lhes prive de qualidade, quantidade e/ou suficiência.
Por sua vez, a relevância, considerada como critério definidor de insumo, é identificável no item cuja finalidade, embora não indispensável à elaboração do próprio produto ou à prestação do serviço, integre o processo de produção, seja pelas singularidades de cada cadeia produtiva (v.g., o papel da água na fabricação de fogos de artifício difere daquele desempenhado na agroindústria), seja por imposição legal (v.g., equipamento de proteção individual – EPI), distanciando-se, nessa medida, da acepção de pertinência, caracterizada, nos termos propostos, pelo emprego da aquisição na produção ou na execução do serviço. Desse modo, sob essa perspectiva, o critério da relevância revela-se mais abrangente do que o da pertinência.
A aferição da essencialidade ou da relevância daqueles elementos na cadeia produtiva impõe análise casuística.
No Recurso Especial se contestava Instruções normativas que reduziam o alcance conceitual de insumos. As instruções foram consideradas ilegais na parte de restrição e foi definido o conceito de insumo.
A tese repetitiva ficou assim:
4. Sob o rito do art. 543-C do CPC/1973 (arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015), assentam-se as seguintes teses: (a) é ilegal a disciplina de creditamento prevista nas Instruções Normativas da SRF ns. 247/2002 e 404/2004, porquanto compromete a eficácia do sistema de não-cumulatividade da contribuição ao PIS e da COFINS, tal como definido nas Leis 10.637/2002 e 10.833/2003; e (b) o conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios de essencialidade ou relevância, ou seja, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de terminado item – bem ou serviço – para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo Contribuinte. (REsp n. 1.221.170/PR, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Seção, julgado em 22/2/2018, DJe de 24/4/2018.)
REFERÊNCIAS
A não-cumulatividade das contribuições incidentes sobre o faturamento na Constituição e nas leis, in Revista Dialética de Direito Tributário n. 111, p. 102.
REsp n. 1.221.170/PR, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Seção, julgado em 22/2/2018, DJe de 24/4/2018.