É o encontro “sem querer” de provas. Encontro fortuito de provas.

Sobre o tema, o professor Renato Brasileiro:

“A teoria do encontro fortuito ou casual de provas é utilizada nos casos em que, no cumprimento de uma diligência relativa a um delito, a autoridade policial casualmente encontra provas pertinentes à outra infração penal (crime achado), que não estavam na linha de desdobramento normal da investigação. Fala-se em encontro fortuito de provas ou serendipidade quando a prova de determinada infração penal é obtida a partir de diligência regularmente autorizada para a investigação de outro crime.”

O doutrinado alerta sobre as condições de validade desta prova:

“Nesses casos, a validade da prova inesperadamente obtida está condicionada à forma como foi realizada a diligência: se houve desvio de finalidade, abuso de autoridade, a prova não deve ser considerada válida; se o encontro da prova foi casual, fortuito, a prova é válida.”

A serendipidade tem íntima vinculação com o chamado “crime achado”, eis que é o “produto” da serendipidade. Crime achado foi bem definido pelo Ministro Alexandre de Moraes:

 
 

“Na dicção da 1ª Turma do STF (HC 129.678/SP, Rel. Min. Alexandre de Moraes, j. 13/06/2017), crime achado é a infração penal desconhecida e não investigada até o momento em que se descobre o delito. Em caso concreto apreciado pelo referido órgão, apesar de ter sido autorizada para investigar um crime de tráfico de drogas, a interceptação telefônica acabou por revelar a prática de um delito de homicídio. Nesse caso, presentes os requisitos constitucionais e legais, a prova deve ser considerada lícita.”

Alguns doutrinadores classificam a serendipidade:

1. Serendipidade de primeiro grau – quando os encontros fortuitos são de fatos conexos ou continentes com os fatos sob investigação. Nesse caso, a prova produzida pode ser valorada pelo juiz.

2. Serendipidade de segundo grau – quando se trata de fatos não conexos ou quando não exista continência com os fatos sob investigação. Nesse caso, a prova produzida vale como notitia criminis.”

 

Contudo, a jurisprudência não se detém a esse “impedimento” de utilização da prova achada apenas como notitia criminis, caso não haja líame entre os fatos, conforme traz Brasileiro:

“A jurisprudência, porém, vai um pouco mais além do entendimento doutrinário, entendendo que, se no curso de uma interceptação que apura infração punida com pena de reclusão descobre-se um delito punido com detenção ou praticado por outra pessoa, a transcrição final da captação pode ser usada não só como notitia criminis, mas também como legítimo meio probatório para fundamentar um decreto condenatório. Nessa linha, o Supremo já entendeu que, uma vez realizada a interceptação telefônica de forma fundamentada, legal e legítima, as informações e provas coletas dessa diligência podem subsidiar denúncia com base em crimes puníveis com pena de detenção, desde que conexos aos primeiros tipos penais que justificaram a interceptação. Do contrário, a interpretação do art. 2º, III, da L. 9.296/96 levaria ao absurdo de concluir pela impossibilidade de interceptação para investigar crimes apenados com reclusão quando forem estes conexos com crimes punidos com detenção.”

 
 

O Supremo já abordou o tema e concluiu pela licitude das provas encontradas:

PENAL E PROCESSO PENAL. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA. APLICABILIDADE DA TEORIA DO JUÍZO APARENTE. ENCONTRO FORTUITO DE PROVAS. ADMISSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. 1. As provas colhidas ou autorizadas por juízo aparentemente competente à época da autorização ou produção podem ser ratificadas a posteriori, mesmo que venha aquele a ser considerado incompetente, ante a aplicação no processo investigativo da teoria do juízo aparente. Precedentes: HC 120.027, Primeira Turma, Rel. p/ Acórdão, Min. Edson Fachin, DJe de 18/02/2016 e HC 121.719, Segunda Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 27/06/2016. 2. Nas interceptações telefônicas validamente determinadas é passível a ocorrência da serendipidade, pela qual, de forma fortuita, são descobertos delitos que não eram objetos da investigação originária. Precedentes: HC 106.152, Primeira Turma, Rel. Min. Rosa Weber, DJe de 24/05/2016 e HC 128.102, Primeira Turma, Rel. Min. Marco Aurélio, DJe de 23/06/2016. (…) (HC 137438 AgR, Relator(a): LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 26/05/2017, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-133 DIVULG 19-06-2017 PUBLIC 20-06-2017)

 

REFERÊNCIAS:

Lima, Renato Brasileiro de Manual de processo penal: volume único / Renato Brasileiro de Lima – 8. ed. rev.,
ampl. e atual. – Salvador: Ed. JusPodivm, 2020.

GOMES, Luiz Flávio. Legislação criminal especial. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009.

HC 137438 AgR, Relator(a): LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 26/05/2017, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-133 DIVULG 19-06-2017 PUBLIC 20-06-2017.